Palavras incríveis, contém o poder de definir, de fazer viver e de matar.Criam a vida por poderoso efeito sugestivo, realçam as diferenças em quem as pronuncia e em quem escuta. Estabelecem as diretrizes da significação e ordenam aleatoriamente os movimentos, de formas que, muitos movimentos são induzidos, pouco reconhecidos no campo da competência e da inserção verdadeira.
A boca sabe como se descomprometer se lhe convém, mas guarda escrúpulos de forma relativa, até o próximo embate. É aonde o sujeito avalia e faz juras para o próximo disparo. Portadora prioritária da linguagem e de seus enunciados, sabe o poder que têm e como usá-lo, sabe abrir caminhos oficiosos para sua compensação, algo como gerar os venenos que contaminam sem serem identificados.
Traduz assim o que é de cada um, as ordens vivas do amor e do ódio, onde se revelam as grandezas e as inferioridades que traem a criatura onde ela, em geral, não quer ser vista. Mas o que é mais difícil de aceitar, e diga-se, paradoxalmente , é que as palavras têm efeitos, e por vezes, irrecuperáveis.
Corre-se atrás do que se disse e por vezes, tarde demais, pois já se foi.
Índole constitutiva da espécie, o falar é a conjugação do humano em toda sua expressão, tanto imanente como transcedente. Atinge-se embaixo e em cima. Figura-se o Céu ou Inferno, eleva-se ou degrada-se à criatura, um gesto de luz ou de trevas, o lugar do bem-dizer ou do mal-dito, que nos torna companheiros ou inimigos por suscetibilidades narcísicas, ou pelo rancor à alteridade inexorável.
O Outro não sai e quer também, afinal, é um direito que reconhecemos somente a força, precisamos de leis e punições para isto.
Então o que nos resta ?
O modo comum de descrendeciamento é um truque simbólico, principalmente porque é feito nas esferas mais íntimas e portanto de direito próprio, lugar onde não se entra sem ser convidado. Ali o outro assume a proporção de um outro-objeto e dejeto das mais ralas des-considerações. Avilta-se a sua grandeza rapidamente e sem explicações, condenação sumária e sem apelação, pois não se explicíta qual acusação.
O gozo sado-masoquista do puro domínio de tê-lo ao sabor emocional do que ressarce e vinga. Esse fenômeno usual e pouco visível de falsa discrição é a base das vinganças ocultas que não precisam se justificar perante aos tribunais jurídicos, mas que têm um poder indescritível no convívio. Representa a gangorra dos altos e baixos das cotações de prestígio e o cemitério dos amores falidos e dos investimentos arrependidos.
É o que nos faz voltar sempre. Retornamos para tentar, no recontrato da esperança de fazer viver novamente o que era importante, para não ficarmos no luto amargo do que inconscientemente nos acusa de termos matado.
Sempre isto nos confunde, pois não sabemos dizer exatamente onde a vítima o é, por a termos matado, onde o ato de matar não esclarece de fato suas razões e nos deixa com a eterna dúvida culpada se poderia ser diferente, se assim tivessemos sido.
A boca é o lugar do tiro e o lugar do crime. É ali que tudo volta para nos incriminar ou nos absolver. Mas quem fará isto? De que Outro se trata quando o assunto é íntimo?
Julga-se, de acordo com o Direito positivo, o que se escreve ou se pode constatar.
Nada se sabe de verdade sobre o crime, estuda-se suas feições, mas não se diz, ou se diz pouco da sua intimidade, sua premeditação como tributo ao investimento fracassado, ao conjunto de fantasias e expectativas que deram ao morto um lugar íntimo que, pelo visto, não mereceu.
A boca sabe disso. Sabe as juras que permitiu serem ditas como amor e sabe das injúrias que arquitetou nos escaninhos, para devolver em proporções maiores o que foi o tamanho da ofensa.
Palavras reflexas e ancestrais que sabem como ofender e destruir, pois houve ofensa e é preciso pagar por isso. O amor pronunciado recolhe-se como grave engano e o ódio, em geral negado, assume sua inteligência de domínio e decide suas estratégias de desvalorização.
Renega-se o que se investiu e dá-se a boca a autonomia sem escrúpulos, onde através de cumplicidades sociais prepara-se o festival das próprias razões, tentativa vão de inocentar o ego, e senha para o ataque que visa saquear a integridade do outro.
Crime diário, com alto poder de invocar forças da alma, se torna lugar de grandes infortúnios, justo ali onde o amor cobra sua dignidade.
Saquear o outro é saquear o próprio amor em suas destinações, inclusive aonde temos que aprender na carne o que os livros não podem ensinar. Se todo fim for destituir o outro, pouco teremos a aprender, a não ser repetir e repetir.
A arrogância criminosa resiste sempre em se dar por vencida e reitera suas razões onde a alma em sua grandeza mostra outros possíveis, inclusive para não ficar presa no defunto.
E esta é dor revoltante que não aceitamos, matar é ficar preso no destino do que morreu. Um tipo de luto que nos faz precisar da humildade de devolvermos ao outro o que lhe pertence e que não nos convém tirar. Criatura tão complexa quanto nós, não pode ser reduzida ao escárnio do desvalor puro e simples.
A boca mediante tal posturação retorce-se para devolver, e as palavras para melhorar suas qualidades. Há que se bem-dizer para separar-se de verdade.
O estranho é quando nos damos conta que somos nós que não o deixamos ir, que as palavras pronunciadas não indicavam de verdade a direção.
Somos nós que ao criarmos um cenário de apêgos particulares, exigimos lealdades contratuais cuja expectativa seria de trazer o impossível a um possível relacional.
Mas como? Isto é o máximo de negação do outro como assujeitado ao destino comum do humano em toda sua amplitude e limitação, o que pode o outro que não possa eu? Mas Freud ensina que a tópica econômica é também a de maior regência, buscamos o prazer, evitamos a dor. A boca e suas pupilas se ajeitam a isto.
Cumprem o protesto inútil de que algo neste sentido possa se alterar. Fala muito quem se recusa, pois as palavras perderam a alma e simulam significados, palavras mortas, um luto crônico de um marasmo sabotador.
Palavras assim são assombrações que ainda buscam atemorizar os vivos intimidando-os. Visam tirar o poder de renovação, ali onde a vida aponta outra cena, outra coisa, já como pedido ao vivo, ao que se rende honestamente, ao que se reconhece, ao que compreende que a boca é a mãe, é gestora e que as palavras nos dizem de sua qualidade materna.
Uma mãe rancorosa é perigo exigente, é uma mãe que não perdoa porque não pode. Estampa o que foi subtraído. A mãe que libera e torna gratuito é a mãe de perdão pelo menor, porque vive no que é maior.
E a nossa boca?
A boca sabe como se descomprometer se lhe convém, mas guarda escrúpulos de forma relativa, até o próximo embate. É aonde o sujeito avalia e faz juras para o próximo disparo. Portadora prioritária da linguagem e de seus enunciados, sabe o poder que têm e como usá-lo, sabe abrir caminhos oficiosos para sua compensação, algo como gerar os venenos que contaminam sem serem identificados.
Traduz assim o que é de cada um, as ordens vivas do amor e do ódio, onde se revelam as grandezas e as inferioridades que traem a criatura onde ela, em geral, não quer ser vista. Mas o que é mais difícil de aceitar, e diga-se, paradoxalmente , é que as palavras têm efeitos, e por vezes, irrecuperáveis.
Corre-se atrás do que se disse e por vezes, tarde demais, pois já se foi.
Índole constitutiva da espécie, o falar é a conjugação do humano em toda sua expressão, tanto imanente como transcedente. Atinge-se embaixo e em cima. Figura-se o Céu ou Inferno, eleva-se ou degrada-se à criatura, um gesto de luz ou de trevas, o lugar do bem-dizer ou do mal-dito, que nos torna companheiros ou inimigos por suscetibilidades narcísicas, ou pelo rancor à alteridade inexorável.
O Outro não sai e quer também, afinal, é um direito que reconhecemos somente a força, precisamos de leis e punições para isto.
Então o que nos resta ?
O modo comum de descrendeciamento é um truque simbólico, principalmente porque é feito nas esferas mais íntimas e portanto de direito próprio, lugar onde não se entra sem ser convidado. Ali o outro assume a proporção de um outro-objeto e dejeto das mais ralas des-considerações. Avilta-se a sua grandeza rapidamente e sem explicações, condenação sumária e sem apelação, pois não se explicíta qual acusação.
O gozo sado-masoquista do puro domínio de tê-lo ao sabor emocional do que ressarce e vinga. Esse fenômeno usual e pouco visível de falsa discrição é a base das vinganças ocultas que não precisam se justificar perante aos tribunais jurídicos, mas que têm um poder indescritível no convívio. Representa a gangorra dos altos e baixos das cotações de prestígio e o cemitério dos amores falidos e dos investimentos arrependidos.
É o que nos faz voltar sempre. Retornamos para tentar, no recontrato da esperança de fazer viver novamente o que era importante, para não ficarmos no luto amargo do que inconscientemente nos acusa de termos matado.
Sempre isto nos confunde, pois não sabemos dizer exatamente onde a vítima o é, por a termos matado, onde o ato de matar não esclarece de fato suas razões e nos deixa com a eterna dúvida culpada se poderia ser diferente, se assim tivessemos sido.
A boca é o lugar do tiro e o lugar do crime. É ali que tudo volta para nos incriminar ou nos absolver. Mas quem fará isto? De que Outro se trata quando o assunto é íntimo?
Julga-se, de acordo com o Direito positivo, o que se escreve ou se pode constatar.
Nada se sabe de verdade sobre o crime, estuda-se suas feições, mas não se diz, ou se diz pouco da sua intimidade, sua premeditação como tributo ao investimento fracassado, ao conjunto de fantasias e expectativas que deram ao morto um lugar íntimo que, pelo visto, não mereceu.
A boca sabe disso. Sabe as juras que permitiu serem ditas como amor e sabe das injúrias que arquitetou nos escaninhos, para devolver em proporções maiores o que foi o tamanho da ofensa.
Palavras reflexas e ancestrais que sabem como ofender e destruir, pois houve ofensa e é preciso pagar por isso. O amor pronunciado recolhe-se como grave engano e o ódio, em geral negado, assume sua inteligência de domínio e decide suas estratégias de desvalorização.
Renega-se o que se investiu e dá-se a boca a autonomia sem escrúpulos, onde através de cumplicidades sociais prepara-se o festival das próprias razões, tentativa vão de inocentar o ego, e senha para o ataque que visa saquear a integridade do outro.
Crime diário, com alto poder de invocar forças da alma, se torna lugar de grandes infortúnios, justo ali onde o amor cobra sua dignidade.
Saquear o outro é saquear o próprio amor em suas destinações, inclusive aonde temos que aprender na carne o que os livros não podem ensinar. Se todo fim for destituir o outro, pouco teremos a aprender, a não ser repetir e repetir.
A arrogância criminosa resiste sempre em se dar por vencida e reitera suas razões onde a alma em sua grandeza mostra outros possíveis, inclusive para não ficar presa no defunto.
E esta é dor revoltante que não aceitamos, matar é ficar preso no destino do que morreu. Um tipo de luto que nos faz precisar da humildade de devolvermos ao outro o que lhe pertence e que não nos convém tirar. Criatura tão complexa quanto nós, não pode ser reduzida ao escárnio do desvalor puro e simples.
A boca mediante tal posturação retorce-se para devolver, e as palavras para melhorar suas qualidades. Há que se bem-dizer para separar-se de verdade.
O estranho é quando nos damos conta que somos nós que não o deixamos ir, que as palavras pronunciadas não indicavam de verdade a direção.
Somos nós que ao criarmos um cenário de apêgos particulares, exigimos lealdades contratuais cuja expectativa seria de trazer o impossível a um possível relacional.
Mas como? Isto é o máximo de negação do outro como assujeitado ao destino comum do humano em toda sua amplitude e limitação, o que pode o outro que não possa eu? Mas Freud ensina que a tópica econômica é também a de maior regência, buscamos o prazer, evitamos a dor. A boca e suas pupilas se ajeitam a isto.
Cumprem o protesto inútil de que algo neste sentido possa se alterar. Fala muito quem se recusa, pois as palavras perderam a alma e simulam significados, palavras mortas, um luto crônico de um marasmo sabotador.
Palavras assim são assombrações que ainda buscam atemorizar os vivos intimidando-os. Visam tirar o poder de renovação, ali onde a vida aponta outra cena, outra coisa, já como pedido ao vivo, ao que se rende honestamente, ao que se reconhece, ao que compreende que a boca é a mãe, é gestora e que as palavras nos dizem de sua qualidade materna.
Uma mãe rancorosa é perigo exigente, é uma mãe que não perdoa porque não pode. Estampa o que foi subtraído. A mãe que libera e torna gratuito é a mãe de perdão pelo menor, porque vive no que é maior.
E a nossa boca?