13.11.11


VAREJOS DA ALEGRIA

Em tempos que a felicidade anda confusa de se ver, e mais ainda de se definir , optei por olhar a vida , para ver o que me diz.
Pós -modernidade , abolição dos sistemas, de doutrinas etc e espírito de liberdade , o tudo pode ser, mas nada é , enfim, um momento único , onde a idéia de "fundamentos" ou mesmo "vontade de potência" parece não passar de um bom yogoberry a escolher o sabor e decidir firmemente sobre qual a calda mais adequada à ocasião.
É melhor não insistir , acho que vai trazer tanta amargura , que comecei a pensar no varejo como alternativa, esse ato que se consome , esse minuto de sabor com apetite , mas um agudo diferencial , esse truque supérfluo , mas de grande valia para auto-estima.
Assim vejo, por exemplo, o valor de um bom churrasco com amigos , mesmo que na esquina, um bom papo regado à chopp , uma boa peça de teatro, um bom filme, uma boa soneca , em geral, depois do rango, um bom jogo de futebol para quem gosta , uma festa animada , uma conversa cheia de graça , um bom degustar de vinho ,quantos pontos que animam a vida e que festejam o brilho e o prazer de se viver.
Uma resistência férrea ao desencanto , ao pessimismo das amarguras alá Cioran , uma constante excessão às perpectivas sociológicas desanimadoras , um borbulhar constante contra o marasmo sombrio da rotina escrava , um ato guerrilheiro contra o imposição injusta das desigualdades sociais.
Se por um lado a felicidade parece englobar o muita coisa de uma vez , esses varejos não , porque não têm essa pretensão toda , não parecem querer erradicar nada e nem subverter algo, apenas garantir o direito à uma boa risada, à uma animação imprescindível para repaginação do cotidiano,  um animo necessário à alma da vida .
Obviamente, que esse homem que se alegra assim ,não frequenta nenhum compêndio filosófico, e esses momentos parecem tão inúteis para qualquer pretensão , que passam por conta de coisa nenhuma , apenas um des-sufoco vulgar , não-letrado e totalmente despretensioso .
Mas isso não me parece exatamente assim.
Digo porque embora , possamos não tirar daí nenhum substrato maior , esses momentos situados são tão prazerosos e agradáveis , que ficam como pano de fundo, a espera de oportunidade . Lacan dizia que o neurótico vive em função do fim de semana , algo que me parece já vem sendo subvertido há muito tempo.
A boa piada bem colocada , um humor que muda o rumo da prosa , uma tirada sutil que desconcerta, o almoço bem digerido e saboreado calmamente , o sorriso espontâneo ,o chopp ao cair da tarde , a celebração da vida sem pretensões maiores , como aquele bom café bem pedido, ou depois do almoço como arremate antes da volta ao trabalho, ou degustado com memórias deliciosas, trazida pelo cheiro inconfundível de família, que o lanche da tarde mediunicamente sempre faz lembrar.
Fico pensando que a memória reserva um lugar especial para essas inscrições , pois são de fácil evocações , voltam trazendo sentimentos do que valeu a pena , das delícias pré-conceituais , pois figuram mais como viagem dos sentidos , o que se sente , unidades de prazeres íntimos e compartilhados , um gozo por estar ali , uma sempre comunhão que naquele instante , nos satisfaz, pois absolvemos a vida e ela não nos deve nada.
Talvez por isso gostamos tanto do recreio , que bela hora de liberdade , uma defesa legal contra seriedade chata de sala de aula, um encontro de movimentos alegres e fugazes , uma gritaria como resposta ao silêncio imposto , um gosto especial de ter amigos .
Depois o recreio vira arranjo aonde for possível , no bar , na rua , no banheiro , em casa , enfim , uma soltura sem habeas-corpus , uma meninice imperdível que nos indica o quanto ser adultos doutrinados é uma violência tida como necessária .

"O mundo está assim porque foi feito por homens sérios e todo homem sério é um perigo" diz Osho , do alto de sua bela sabedoria espiritual , um mestre que propõe " viver é sorrir",e tem a dança como terapêutica , um êxtase contra repressões desnecessárias que só servem para nos manter infelizes , afirma.
"A felicidade derruba governos " afirmo eu , na linha rebelde de Osho , para quem governos e governantes não se interessam pelo povo feliz , porque se tornariam desnecessários ou obsoletos . De certa forma há um ranço predominante onde um pouco mais de alegria , já pode se tornar uma ameaça , pois a ordem vigente foi feita para regular valores e condutas que não atrapalhem muito e evitem o novo , esse sim o desejo prometido, e renegado aos confins de uma utopia impensável.

Estratégia perversa de quem não quer sair do lugar , unicamente porque não convém , reprime-se o novo como perigo , nunca se sabe aonde vai dar , obriga-se o de sempre , que embora cansado e monótono não incomoda enquanto subversão , apenas como insatisfação , que pode deslocar-se como sintoma.
Talvez a situação árabe na África do norte , estejam mostrando que se suporta durante um tempo, que até pode ser longo , principalmente quando do outro lado alguém tem um exército a disposição, mas a vida sem alegria e sem mudança sugere a pergunta , pra que então?

Se tudo fica sério, engendra razões intocáveis e autoritárias , que buscam se impor como ato de força e violência , uma insanidade muito diferente da que se vê nos hospitais psiquiátricos, e porque têm poder, recusam o diagnóstico e as medicações.
 Nossa querida rua da alfândega , lembra um amigo, é o locus da revolução mundial , onde árabes e israelenses comem quibes e esfihas juntos , dividem o mesmo espaço e não soltam bombas ,há anos.
É incrível também, como a alegria descontrai a vida , evita o visgo pegajoso das conversas cheias de venenos , cujos tentáculos buscam cumplicidades nas mediocridades implícitas ou explícitas das mentes opacas , desfaz o tom severo das profecias sombrias , aproveita o cenário para uma conexão inusitada , enfim , um perigo para os pessimistas doutrinários e para estagnação sugestiva e hipnótica dos que querem pregar verdades.

Esse garimpo no cotidiano é tão ou mais interessante , quando vemos que embora determinadas ligações se façam por interesses ou obrigações , as que são mais procuradas são aquelas onde se pode rir . Passada a reunião de trabalho ou outra qualquer , forma-se o cenário onde abre-se conversas que buscam o bom humor , um prazer de conexões sinápticas que não viam a hora da reunião acabar .

Quando algum tempo atrás votou-se no macaco Tião para governador , achou-se isso uma alienação política e rapidamente analistas chatos entraram em ação , não viram aí , que o surreal é a resposta do humor ao que perdeu a graça , o que só aborrece e não faz mais rir, a não ser de deboche.
De certa forma tudo tende a chatice, depois dos 5 minutos usuais, se não houver riso .Sem riso o relógio é um compasso monótono , as cartilhas que ensinam a vida se tornam obsoletas, a vida perde o tônus e sua coloração se embota , os dentes ficam cariados por falta de serotonina, e o amor sem o riso é um gesto brusco .
Sorrisão pra todos
















Há ou não inveja do pênis?