Expressão um tanto grotesca cheia de recheios dúbios , ganhou força em dois sentidos:
Como algo mal feito , tipo rápido , sem maiores entregas , preliminares que não chegam
lá, logo, deixa a dever.
E também como depreciação erótica das coxas , enquanto fetiche masturbatório , um tipo de roça-roça , ato menor , faltoso , paliativo , carência de um penetração mais decisiva .
Mas convém lembrar que as coxas serviam como lugar de feitura das eiras e beiras das telhas que compunham os telhados coloniais e que ficaram também consagradas como na expressão " sem eiras nem beiras", algo sem sentido preciso , desconexo , ou inadequado.
No entanto, numa cultura sexualmente fálica como a nossa, a transa fica como pano de fundo das imagens simbólicas, um tipo de sugestão rápida para facilitar o racíocinio ou um desenho econômico para dispensar maiores elucidações.
"Nas coxas " é assim de uma rapidez extraordinária . " Pô , isto foi feito nas coxas".
Bom , dependendo das coxas , poderia ser um elogio , mas aqui a figuração trata as coxas como coisa única , não importa a coxa, foi mal feito e pronto.
A coxa é uma parte especial da perna , em geral mais carnuda, parte cobiçada nos churrascos , fetiche do olho para homens e mulheres ,como indicativo de gozo supostamente garantido.
Próxima da genitália , compõe um conjunto cobiçado , uma conjunção curva e cheia de promessas desejantes ,já que a frente e as costas aí se complementam como cara e coroa de uma moeda carnal , disputa para as fantasias e para o jogo do que se mostra e do que se esconde , para se ver depois.
Mas embora este modo linguageiro , tenha lá inconteste liberdade e expressão sugestiva , no sentido primeiro , como algo mal-feito , é um tipo espelho do que poderia ter sido melhor , caso não fosse feito nas coxas .
Curioso, é que o tempo parece nos oferecer um sentido de perfeição incompleta , mas que destaca o modo como nos engajamos , o como nos inserimos , o quanto nos empenhamos com verdade e não com imposturas , falácias que se perdem , que ficam como elementos soltos na cadeia deste empenho . É como se os resultados , ficassem a parte , ou não importassem tanto enquanto uma qualidade consagrada. Faz-se nas coxas.
O compromisso com o fim bem-feito se descaracteriza , já que não é mais visto como essencial , algo ao subverter os meios , apequenou o fim.
É uma pena , pois na verdade , construções qualificadas dão trabalho e requerem empenho do início ao fim da cadeia , e o fim é o ápice do possível verdadeiro e que reitera o aprimoramento como um valor essencial da vida.
Talvez isto faça diferença entre pessoas, grupos e nações , o fazer e fazer bem-feito .
Porque não ? Porque não fazer bem-feito?
Há um tipo de argumento pronto e nas coxas,de que uma simulação de resultado não resulta em maiores transtornos por ninguém ver. Confunde-se totalmente a ordem e a primazia da obra , pois há aí uma trapaça . É como se quem vai usufruir pudesse ser lesado , na conta de que o coração não vê , os olhos não sentem . Argumento venenoso em todas áreas da vida , que tem causado emperramentos custosos e dolorosos , pois subtrai o que se acha que não existe , ou seja, a ordem comunitária em sua vigência na alma comum.
Como estamos implicados na ordem de um pertencer em que desde a família como base , e depois todas ordens de uma grupalidade social , somos portadores e participamos de um laço comum . Essa alma comum tem vida e se ressente muito quando subtraída e contém nosso patrimônio particular ,que deve ser usado para vivificar estes elos comuns. É como se tivessemos e temos , dentro do que recebemos a obrigação de melhor qualificá-los e devolvermos ainda melhor. Uma ciranda de grandezas e devoluções maiores , pois o que temos em comum depende disso .
É como se tivessemos que escolher entre construir se esforçando e tendo trabalho , e aceitando os desafios que nos fazem aprender de verdade , ou fazermos circular moedas de simulações que parecem mas não são .
É incrível como a todo tempo ouvimos as dores e revoltas das mentiras e tapeações , que fizeram das coxas um lugar repulsivo e de má-fé . É como se a própria escolha de um bonito lugar como as coxas , para alavancar metáforas obscuras , já fosse um trapacear ético e estético, onde a reverência ao sentido maior da vida não passasse de um truque , engôdo de uma esperteza que faz da vida uma arena para os gladiadores do cinísmo.
Estes apontam as coxas como um lugar de prazer econômico onde se goza com menos trabalho. Aqui o incompleto não é fruto de dificuldades sinceras , mas de segundas intenções que se des-comprometem com facilidade , patamar de uma facilidade perversa e por vezes cruel , justo por faltar o escrúpulo do quanto se lesa o patrimônio comum.
Aqui é como se não houvesse ladrões nomeados e sim dissimulados . É um tipo de crime que quando de trata da ordem social é bárbaro , pois é o dinheiro que ao ser usado mais ou menos , já tinha destinação particulares no que sobrou .
Estima-se pra cima e puxa-se pra baixo .
Na ordem pessoal é um vício que faz falta à realização , talvez justo ali aonde a vida poderia ser maior e mais bonita. É um gosto covarde do incompleto que faz chorar .
É o lugar onde o menos seduziu com riquezas pífias e levou o brilho que só as grandezas têm.
Se podemos ir mais porque não fazê-lo?
Um gesto pode ser um diferencial de qualidade que se inscreve também para o futuro , haverá quem nos agradeça , por devolvermos as coxas o seu devido lugar de requinte e de fantasia onde o erótico é um modo de sensibilidade e de apreciação .
Deixemos as coxas livres para o olhar e façamos bem feito e com amor o que nos compete.
Assim Eros agradecerá o desfazer do emaranhado que o tornou um deus das propinas e dos argumentos fáceis , pois sua natureza é alada e faz subir , assim das coxas podemos completar a integridade do ato.
Não resta dúvidas que em todos os momentos históricos avalia-se o ser humano por parâmetros econômicos. Não obstante as expressões tendam a inserir-se no discurso com conotações váriadas, suas origens estão, no mais das vezes, na discriminação do outro por sua posição economicamente menos favorecida. Eira designava terreno dos senhores de engenho e beira uma espécie de aba que so os telhados das casas dos mais abastados possuiam. Daí a expressão "eira nem beira". E quem eram, senão os escravos, os artífices das telhas moldadas em suas próprias coxas? Daí que, fazer "nas coxas", e coisa de gente menor. E assim vamos repetindo expressões e nos repetindo pela vida afora. O descompromisso com o coletivo, a incapacidadede se ver como elo de um sistema que se retroalimenta, vai gerando medos e carências e estimulando o acúmulo por poucos e uma maioria de "sem eira nem beira" vivendo num sistema social "feito nas coxas". Sem poesia...
ResponderExcluirDeixo aqui meu comentário simples e de palavras simples: gostei do texto!! Você tem toda razão - vamos subverter esse menosprezo. As coxas, como tenho ouvido nas praias cariocas, são sim alvo de muitos elogios. Façamos jus às nossas belas redondezas!
ResponderExcluirBeijos, Alexey, boas escritas!